sexta-feira, 7 de maio de 2010

Héctor Abad Faciolince vence o Prémio Literário Casa da América Latina

0comentários

Héctor Abad Faciolince acaba de vencer o Prémio Literário Casa da América Latina/Banif 2010, com o romance "Somos o esquecimento que seremos".
Editado pela Quetzal, este romance conta o assassinato do pai de Faciolince pelos paramilitares colombianos, a partir de uma carta encontrada no bolso do seu casaco. A apresentação deste romance foi um dos momentos mais marcantes da edição de 2009 das Correntes D'Escrita.

Francisco José Viegas para a África do Sul, já.

0comentários

"Era o dia 16 de julho de 1950. Quatro horas e cinquenta minutos. Como é que eu não consigo esquecer esse horendo dia? Trinta - trinta, puta que pariu! -, trinta oportunidades de gol perdidas pelo nosso time e, inesperadamente, o Ghiggia chuta torto e a bola passa entre a trave e o nosso goleiro Barbosa, que fechara o ângulo corretamente. O nosso Barbosa e todos os duzentos mil espetadores - que ninguém esperava que o Ghiggia errasse o chute, e errando nos causasse toda aquela desgraça. (...) Quando o jogo acabou, o silêncio foi profundo, tão estrondoso (perdoem o oximoro) que doía em nossos ouvidos. Duzentas mil pessoas mudas e surdas. Até os choros eram silenciosos, e as lágrimas escorriam apenas dos olhos mais fortes, aqueles que não haviam ficado transidos, estarrecidos e obnubilados com a desgraça que se abatera sobre nós."
in "O romance morreu", Rubem Fonseca, 2007, Companhia das Letras

Este trecho faz parte de uma crónica de Rubem Fonseca sobre o mais trágico dos campeonatos do mundo para os brasileiros, o Brasil'50.
A jogar num Maracanã lotado, a selecção brasileira despedaçou a Suécia (7-1) e a Espanha (6-1). Na final, um Uruguai matreiro abateu o sonho de milhões. Jules Rimet acabou por entregar a taça à selecção vencedora sem pompa nem circunstância, erante a debandada geral, do publico e da organização. Estes e outros relatos das venturas e desventuras do futebol brasileiro chegam até nós por alguns dos escritores mais talentosos que o Brasil conheceu. Nelson Rodrigues foi de todos o melhor a relatar os dramáticos remates ao coração de uma pátria em chuteiras. Crónicas que se encontram reunidas nos volumes "À sombra das chuteiras imortais" ou "A pátria em chuteiras".
Portugal ainda não encontrou uma voz capaz registar um mundial como deve ser. Por isso acho que deveríamos fazer uma vaquinha para levar o Francisco José Viegas à África do Sul. Ele e o Jaime Ramos. Os dois devem-nos um mês de crónicas diárias sobre o mundial. Os dois devem-nos um livro de crónicas sobre o mundial. Só eles serão capazes de escrever o inevitável, tal como Nelson Rodrigues escreveu:
“Todavia, a nossa vitória está ameaçada, e por quem? Respondo: - pela nossa burrice. De quando em vez, eu faço a justa, a exata autocrítica nacional: - somos burros! somos burríssimos!”
in "A batalha da burrice", Nelson Rodrigues, 1962, Jornal dos Sports

A inveja é uma merda

0comentários

É uma das figuras importantes das letras brasileiras, com vasta obra no campo da reportagem e da não-ficção. A biografia de Xico Mendes, o seringueiro defensor da Amazónia assassinado por um fazendeiro, rendeu-lhe prémios e reconhecimento nacional. Em 2001, a convite de uma editora, participa da colecção Pecados Capitais, em que sete escritores foram desafiados a escrever romances sobre um pecado. Zuenir escolheu a “Inveja – O mal secreto”, agora reeditado em Portugal, pela Planeta.

Marechal na Reserva (MR) - A sua obra vive muito da reportagem, curiosamente este “Inveja” é uma espécie de híbrido entre a reportagem e a ficção. Vê o livro assim, como híbrido?
Zuenir Ventura (ZV) - É isso sim. A ideia era a de fazer uma ficção, mas quando comecei a trabalhar no livro tive muita dificuldade em encontrar personagens. Na pesquisa que ia fazendo ia percebendo que era complicado encontrar invejosos. Fala com o taxista, com o dentista e todos garantiam que não eram invejosos. Aí comecei a pensar em construir o livro também com personagens inventados, isto é, misturava realidade com ficção. Eu acho isso legal, porque instiga a curiosidade. Durante muito tempo as pessoas abordavam-me para saber se a protagonista, a Kátia, era real ou ficção. Eu respondia que sobre ela eu não falava, adensando o mistério. Agora posso dizer que a Kátia é mentira, algo que decepciona muita gente. A Kátia tem um envolvimento com o narrador, que é o autor, ou seja, eu. Então as pessoas vinham ter comigo e perguntavam como é que a minha mulher, com quem estou casado há 50 anos, tinha reagido a isso. Eu acabei por misturar a ficção com a não-ficção para tornar o livro mais rico.

MR - Este livro é o somatório de três livros. É um livro sobre a inveja na teoria, ou seja, sobre as definições do que a inveja. Um terceiro livro sobre a inveja na prática, quando conta o crime movido por sentimento em torno da Kátia. E, finalmente, um livro sobre a inveja enquanto processo, nos momentos em que descreve o cancro de que sofreu enquanto pesquisava e escrevia o livro. Concorda com esta leitura?
ZV - É interessante essa observação e eu acho que é isso mesmo. Quem também me fez essa leitura foi o Ruben Fonseca (Prémio Camões 2003), o maior romancista brasileiro. Ele também acha que o romance é composto por três livros. Eu também acho que o livro tem essas três narrativas e a estrutura assenta nisso.

MR - Sei que mesmo depois de ter editado o livro que descobriu muito mais similitudes entre a inveja e o cancro. O que têm eles em comum?
ZV - Foi para mim uma surpresa essa relação. Este livro está escrito como um making-of. Eu escrevo a forma como se foi desenvolvendo a pesquisa e o acto de o escrever. Portanto quando soube do cancro eu não pude deixar de incluir esse momento, tão importante na minha vida, no livro. Depois que incorporei essa ideia, eu apercebi-me como ambos são inconfessáveis, a inveja e o cancro, e como vão roendo, silenciosamente, por dentro.

MR - Para além da inveja, o romance vive muito da cidade do Rio de Janeiro. Apesar dos esforços feitos pelo governo Lula, o Rio continua a ser uma “cidade partida”?
ZV - É, ainda continua assim e eu espero que mude. Eu não me orgulho nada de ter criado esse titulo de “cidade partida”, mas o facto é que ela continua partida. Eu acho que ela não será tanto uma metáfora, mas antes uma metonímia do país real. Agora com a realização da Olimpíadas no Rio, eu acho que se abriu uma boa perspectiva para a cidade. Vamos ter de cumprir prazos, vamos ter de construir coisas e isso pode ajudar a tornar a cidade menos partida. Eu sei que é um processo histórico muito demorado, essa fractura foi aumentando lentamente, mas as pessoas estão muito esperançosas nesta mudança. Eu acho que não dá para não cumprir essa vontade de sarar a fractura. Vamos esperar para ver e cobrar dos governos esse objectivo.

MR - O Zuenir tem uma vasta obra e só há quatro anos foi publicado em Portugal. Muitos outros grandes escritores brasileiros e portugueses continuam sem edições nos dois países. Porque é que vivemos assim de costas voltadas, Portugal e Brasil?
ZV - Eu acho que vocês têm de ajudar a encontrar essa resposta. Eu fui criado, a minha formação toda foi feita lendo o Eça de Queiroz, Antero de Quental, Camilo Castelo Branco. Isso foi muito importante para mim. Este corte não se percebe. Há muitos escritores por publicar em Portugal e vice-versa. Mais do que andar a fazer acordos ortográficos devíamos fazer acordos de união que possibilitem que nos possamos conhecer melhor.



"A inveja é uma merda"
A expressão vem impressa num dos mais populares autocolantes usados pelos camionistas brasileiros e sintetiza o que muita gente pensa sobre o sentimento. Zuenir Ventura, quando decidiu escolher a Inveja como o pecado a trabalhar em forma de romance, para a colecção “Pecados Capitais” da editora brasileira Objectiva, não sabia no que se estava a meter. O baiano João Ubaldo Ribeiro preferiu a Luxúria, Luis Fernando Veríssimo, um bom garfo, atirou-se à Gula, mas o que podia inspirar a Inveja em Zuenir.
O livro resulta numa espécie de making-of do autor a escrever o livro. Ao longo dos capítulos vão-se misturando os esforços de pesquisa sobre o tema, a luta de Zuenir com um cancro na bexiga e a estória de Kátia, cuja disputa da atenção por dois homens termina em homicídio. O jornalista brasileiro, que abeira os 80 anos, explora o mais inconfessável dos pecados enquanto teoria, enquanto prática e enquanto processo, com uma sabedoria extraordinária. Mais de 70% dos brasileiros acham que a Inveja é o pior e o mais praticado dos pecados. Contudo pouco mais de 10% dos brasileiros assume ser invejoso. Zuenir explora esta dicotomia, entrevistando especialistas, investigando como a Inveja pode virar crime e como ela é uma espécie de cancro que toma conta, de quase toda a gente, mortal e silenciosamente.

Roubei um gravador

0comentários
como não sou deputado, é natural que vá postando algumas entrevistas a escritores de língua portuguesa, leituras avulsas e ideias várias.
 

Marechal na reserva © 2010

Blogger Templates by Splashy Templates