quinta-feira, 1 de julho de 2010

Transa Atlântica


                                                                     Transa Atlântica
                                                                     Mónica Marques
                                                                     Quetzal

Se há um deficit de Portugal perante o Brasil ele não está nas alas, nem tão pouco no jogo aéreo, mas na crónica.
Terreno em que o jornalismo e a literatura se promiscuem despudoradamente, a crónica é um claro exemplo do que separa as literaturas ligadas pela mesma língua. Onde em Lobo Antunes e Gonçalo M Tavares há primado da forma, em Luis Fernando Veríssimo e Ivan Lessa há um despudor direto e simples.
É um facto que os atuais cronistas brasileiros sucedem a nomes como João do Rio, Olavo Bilac, Rubem Braga ou Nelson Rodrigues. Portugal nunca conseguiu ter a mesma fartura, pelo que Miguel Esteves Cardoso acaba por ser a exceção que confirma uma triste regra.
Mónica Marques, a viver há 10 anos no Rio de Janeiro, bebeu a tradição cronista brasileira e converteu-a num blogue e no seu primeiro romance “Transa Atlântica”.
“Os cronistas são como os bufarinheiros [vendedor ambulante], que levam dentro das suas caixas rosários e alfinetes, fazendas e botões, sabonetes e sapatos, louças e agulhas, imagens de santos e baralhos de cartas, remédios para a alma e remédios para os calos, breves e pomadas, elixires e dedais”, a definição é do escritor Olavo Bilac e assenta como uma luva à escrita e universo de Mónica Marques. Mónica abre a sua gaveta e lá encontramos postais ilustrados, um bikini e uma sunga, um recorte do Expresso e uma fita do Senhor do Bonfim, um romance do Rubem Fonseca e um CD do José Mário Branco.
A gaveta de Mónica Marques, a que ela chamou “Transa Atlântica” é essa “mistureba”, a saudável promiscuidade entre o Brasil e Portugal.
A narradora espalha o conteúdo da sua gaveta, muito parecida com a da autora e muito diferente da de Mónica Marques, e conta a sua história, as suas relações, os seus desejos, com a alegre anarquia que só uma gaveta muito desarrumada consegue providenciar.
Assim se explica que este livro, emocionalmente, nos faça subir ao Corcovado como de repente nos atire do alto da Pedra da Gávea, pois é assim que a cidade maravilhosa transforma as betas burguesas em melhores escritoras.
O Rio desempoeirou a escrita de Mónica Marques e ela agora flana, com a ligeireza de quem se sente aliviada de 800 anos de circunspeção.
“O suplício daquelas ancas balanceadoras, dos passinhos perfeitos e das bundas inacreditáveis na nossa cara de estúpidas, costumam fazer de nós mulheres muito mais humildes”, explica Mónica Marques como que retratando esse sentimento luso perante a crónica brasileira e a sua escrita

1 comentários:

Jô~ disse...

Adoro os livros Brasileiros! Principalmente livros como "o terceiro Travesseiro" de Nelson Luiz de Carvalho, "Eles continuam entre nós" de Zíbia Gasparetto, "1808" de Laurentino Gomes, "Crocodilo Sonhador" de Vanda Amorim, "Morangos Mofados" de Caio Fernando Abreu, "Mongólia" de Bernardo Carvalho, "Outra Vida" de Rodrigo Lacerda, "Leite Derramado" de Chico Buarque, "Os Espiões" de Luis Fernando Verissimo entre outrissimos que são lançados mensalmente. =)

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